Fantasma – Nilton Resende

Um livro que transmite de forma rica, profunda e imensamente reflexiva como a solidão corrói a nossa alma. Através da visão de um ser invisível, um fantasma, o leitor consegue enxergar o quanto ser solitário é desesperador.


Nome: Fantasma
Autor: Nilton Resende
Páginas: 94
Editora: Trajes Lunares


Sinopse: Um fantasma que vive em um quarto simplório de uma pequena hospedaria e observa constantemente o vai e vem das pessoas que por ali passam. Famílias que chegam e que se vão, sem nunca reparar na existência solitária daquele ser. É nessa solidão constante que o Fantasma começa a se sentir vazio, passando a desejar por companhia, por risadas e conversas. Mas como pode? Afinal, ele é apenas uma existência sem corpo, invisível a olhos humanos.


Fantasma” é aquele tipo de livro que apresenta inúmeras reflexões ao longo da leitura. Por ser uma obra narrada em fluxo de consciência, acaba sendo um tanto confusa. No entanto, esse é o tipo de narrativa que aproxima o leitor do personagem e o faz ponderar sobre como a solidão afeta significativamente a vida das pessoas. Além disso, a obra também expõe questionamentos pertinentes sobre o que seria um fantasma e se essa criatura invisível possuí sentimentos, emoções e desejos?

“Pela primeira vez sente medo daquilo que talvez possa estar se tornando, e são tantas as imagens, uns sonhos, uns gostos, os gestos nunca satisfeitos, este hiato, uma fenda entre o querer e o fato, nenhum deleite. Quero Dormir.”

E são essas divagações existenciais que regem a narrativa.

Um ponto pertinente a ser mencionado, é como o leitor se apega e sente empatia pelo Fantasma que relata os seus dias solitários ao longo da obra. É triste ler como cada passagem de tempo se torna apenas uma lembrança dolorosa de algo que o personagem, e narrador da trama, presenciou, mas não vivenciou.

A solidão presente nesse livro é desoladora e causa um forte sentimento de empatia pelo protagonista que deseja apenas um pouco de consolo em sua existência invisível.

Afinal, para o narrador dessa obra, não existem memórias ou lembranças de uma vida humana.

O que são fantasmas?!

É interessante perceber o quanto “Fantasma” faz com que nós, meros leitores e espectadores, questionemos a existência e a formação desses seres que não são visíveis a olhos insensíveis.

Na realidade, até mesmo o mais cético dos leitores, se pegará questionando sobre o que de fato seria um fantasma.

“Há tempos me sei e só eu me sei. Há tempos me saibo. Há tempos me roo e só eu me toco. Há tempos nem eu me toco. Há tempos eu me imagino. Há tempos eu me teço, eu me faço. Há tempos, vejo-me soçobrando neste cômodo, restolho de todos que aqui vieram e vêm, um dardo sem mira, largado por algum doo, um dardo lançado a esmo, sem tempo e espaço. Há tempos estou na encolha, e quero larguras, passos, saltos.”

Aqui, nosso narrador Fantasma não possuí um corpo ou uma forma definida; ele é apenas um algo, um ser indefinido, uma lembrança de retalhos do que ocorre dentro do pequeno quarto de pousada que ele considera sua moradia, sua casa. Uma criatura imaterial, mas que assim como nós, possuí sentimentos e emoções.

É intrigante pensar que os fantasmas que podem existir por aí, tenham sentimentos tão semelhantes e aflorados quanto os de nós, seres humanos vivos. A realidade, é que nunca paramos para pensar no que realmente seria o pós vida e se nela teríamos algum tipo de lembrança ou mesmo traços de emoções.

Um questionamento a ser refletido durante horas, dias e talvez semanas ou meses.

Nada mais que Lembranças

Talvez esse seja o ponto que tenha me conquistado em “Fantasma”, o fato da obra se assemelhar a um relato de lembranças adormecidas em uma memória ao invés de ser apenas uma narrativa cotidiana que ocorreria em um pequeno quarto de hotel, pousada ou pensão.

Aqui, o Fantasma que nos conta a história está vivo na narrativa, ao mesmo tempo em que não se faz presente nela.

É intrigante, pois essa é uma forma peculiar de apresentar um personagem repleto de emoções e reflexões, que faz com que o leitor se sinta impelido a pausar a leitura e refletir de forma profunda sobre os vários dilemas que perpetuam em existência.

“Pôs-se a imaginar possibilidades, e agora mesmo lembra-se disso, pois lembrar-se é o que mais lhe resta no quarto fechado, dentre tudo que lhe resta.”

E a forma como o passado e o presente se mesclam ao longo da narrativa é formidável, visto que toda a obra faz parecer com que os devaneios do Fantasma se assemelhem a uma extensa colcha de retalhos feita de memórias. Um fato interessante, pois afinal o que são as coisas existentes se não meras lembranças nossas, de nossos antepassados ou de pessoas que não chegamos a conhecer.

A vida é uma eterna lembrança, uma eterna colcha de memórias e o Fantasma que nos conta essa história percebe isso com pesar. Afinal, ele é o único que detêm todas as lembranças daquele quarto, sem estar presente em nenhuma delas.

A representação da Solidão

E nesse ponto, acredito que caiba um pouco da minha interpretação pessoal sobre a obra em si. Isso porque, essa não é uma narrativa comum, mas sim um exercício de linguagem, que faz o leitor refletir e ao mesmo tempo interpretar tudo que o autor quis evidenciar em suas palavras.

Em minha percepção, esse livro aborda de forma sutil e ao mesmo tempo crua, o quanto a solidão é desesperadora e cruel com aquele que se encontra preso dentro de sua própria jaula mental.

O Fantasma da narrativa, é um solitário, não por opção, mas por consequência, e tudo que ele gostaria era de ser ouvido e compreendido pelas pessoas que passam por sua vida sem nunca notarem a sua desolação e desespero.

“Em dias de solidão, a luz lambendo o cômodo era a sua companhia; e também à noite, quando tocava o quarto com a sua língua fria.”

Se o leitor olhar com olhos atentos para as metáforas contidas na narrativa, perceberá que o Fantasma, protagonista da obra, pode ser uma pessoa comum, como eu e você, que acabou ficando sozinha no mundo por algum motivo e que não consegue sair de seu próprio calabouço mental.

Talvez esse não seja um texto metafórico, mas acredito que a mensagem que o autor deseja passar é a de que sempre existe uma salvação para a solidão.

Fantasma” é um livro em fluxo de consciência imensamente reflexivo e que possuí uma carga melancólica forte ao evidenciar com sutileza, como a solidão é significativa e destrutiva. Um livro que causa empatia ao apresentar um personagem que apenas queria ser visto, ouvido e entendido.


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3 comentários em “Fantasma – Nilton Resende

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