Resenha do Livro "Histórias do Meio do Mundo"

Histórias do Meio do Mundo – Julianne Veiga

Escrito por:

Um livro dotado de uma escrita poética que consegue através de nuances belíssimas apresentar ao leitor tramas corriqueiras de pessoas, em sua maioria mulheres, simples e comuns. Uma obra capaz de causar emoção, reflexão e empatia.


“Cabe muito em um nome pequeno, cabe Ana toda em si mesma, o que não é pouco, cabe, ainda, o universo inteiro que ela carrega consigo, que tanto a compõe como a vivifica e atormenta.”

Nome: Histórias do Meio do Mundo
Autor: Julianne Veiga
Páginas: 132
Editora: Patuá


Esse é o livro perfeito para fazer o leitor refletir sobre os caminhos que tem assumido em sua vida. Não apenas isso, é o tipo de obra que consegue causar empatia pelo próximo, fazendo com que seja possível compreender certas escolhas ou sofrimentos ocorridos.

Em “Histórias do Meio do Mundo” conhecemos narrativas que exibem a vida de pessoas comuns, dessas que encontramos por aí, pelo mundo afora. São tramas simples e corriqueiras que transportam o leitor para os recantos mais sensíveis da mente de cada um dos personagens apresentados, expondo seus pensamentos, suas dores, suas formas de ver a vida ou de refletir sobre o passado e as escolhas consideradas.

“Para ela, o mundo tinha dois lados. Pela perspectiva dela a vida oscila em movimento pendular constante entre a bilateralidade dos extremos que s contrasta, – o bom e o ruim, o preto e o branco, o gosto e o desgosto, por aí vai.”

Através de uma escrita poética, profunda e repleta de lirismo a autora, Julianne Veiga, apresenta histórias triviais de pessoas comuns. Narrativas que relatam vidas cotidianas. O mais incrível nesse ponto, é que é fácil ler cada um dos contos e se lembrar de alguém conhecido. Aquela pessoa simples que em algum momento da vida nos desejou um “bom dia”.

Em cada um dos textos conhecemos um personagem, em sua maioria mulheres, que teve a vida modelada por suas escolhas. Personagens humanos que sofreram em relacionamentos ou empregos abusivos. Mulheres que se encontraram com a maternidade ou se perderam devido a ela.

Aqui, não há nenhum tipo de romantização, mas sim, uma forma de narrar que torna cada uma dessas histórias únicas. Relatos que apresentam um retrato fiel do ser humano.

Destaco aqui, cinco dos contos que mais apreciei.

Todas as vozes

Aqui conhecemos um morador de rua que ao que parece possuí esquizofrenia. Sem saber seu nome ou para onde ir, a única coisa que temos quase certeza é de que se trata de um homem. Durante seu relato, acompanhamos o sofrimento de uma pessoa que foge das vozes enlouquecidas em sua cabeça, ao mesmo tempo em que foge da humilhação que lhe é imposta pela crueldade humana que simplesmente não percebe sua dor e desespero.

“Vivo, sequer me dou conta de que vivo, como não se dão conta disto os que me ameaçam. Não percebem que sofro. Sou coisa. Só ultrapasso o nada pela utilidade que tenho para o escárnio. Sigo ouvindo o galo, as vozes, correndo de meninos, das pedradas e de mim.”

Eu gostei de como esse conto consegue fazer o leitor não apenas ter empatia por pessoas em situação de rua, como também mostra como a vida dessas pessoas não é fácil, ainda mais se elas possuem algum distúrbio mental. Ser xingado e humilhado é muito doloroso.

Confidências

Nessa trama, acompanhamos duas vizinhas que conversam em frente a casa. O enredo em si gira em torno de uma das moças, que em meio a receitas de bolo, começa a desabafar sobre sua vida e seu passado, falando com sinceridade sobre a carência paternal e como tentou supri-la através do casamento.

“Nuca amou o marido, agora consegue ver. Talvez ele tenha sabido disto desde o começo. Talvez por isto ela tenha sido tão castigada. Reflete e já não sabe mais se foi castigada, se foi vítima ou se foi dos dois o algoz. Mas tal percepção, fez com que ela, enfim, se sentisse liberta. Não precisava mais agradar a nenhum homem para dele receber o amor paterno. Pode, assim, dispensar o amor que nunca lhe foi dado.”

Eu gostei de como essa narrativa se desenrola, sendo contada pela personagem em uma espécie de devaneio em que ela se lembra cronologicamente de como conheceu e se casou com o parceiro. O interessante nesse conto é perceber como a mulher se vê, depois de tanto tempo, como uma pessoa que moldou o marido com base naquilo que ela sentia falta.

Jandira

Nesse conto conhecemos Jandira, uma mulher que quando menina foi vendida para o patrão de sua mãe e passou a viver como empregada da família. Vislumbramos a mente da personagem para entendermos como ela pensa, ou melhor, como foi moldada a pensar. Sem um salário e sem qualquer perspectiva de vida, vemos a moça sofrer todo tido de abuso na casa em que trabalha, chegando a perder a própria sanidade mental.

“Sendo da família, considerada como se dela fosse parte, não era empregada. À Jandira, portanto, não era devido salário. Ela era de casa. Não trabalhava, ajudava, lembravam-na sempre.”

Meu favorito. Esse foi o conto que mais tocou na minha alma pelo motivo de falar sobre uma mulher comum que perdeu seu nome e sua vida por ter de trabalhar para uma casa de família que a maltratava. O mais triste dessa história, é refletir sobre quantas “Jandiras” não existem por aí. Mulheres vítimas de um trabalho abusivo.

Cartas pela Web

Nessa história acompanhamos uma mulher que conhece um cara em uma estação de metro e ambos passam a trocar correspondências através da internet, iniciando assim um amor virtual. Até que… Bem, as coisas não saem exatamente como a moça havia sonhado e o príncipe encantado se torna um sapo.

“Entendi, por fim, a razão pela qual tinha acabado de não me reconhecer: você vê a mulher como gênero, daí, qualquer uma serve. Você não observa a pessoa com quem está falando. Observa a si mesmo, um macho em ação.”

O que eu gostei dessa história foi da força da personagem que ao se ver em uma situação complicada se coloca por cima e dá um basta na situação. Aqui, a história mostra a desilusão amorosa, apontando as dores e a confusão que se faz presente na mente da moça que acreditou em um amor a primeira vista que nunca foi real.

O Nome que não era dela

Aqui conhecemos a história de uma mulher chamada Gertrudes que por motivos específicos não gosta de seu nome. Entendemos sua história e a de sua família, percebendo o quanto a maternidade não foi importante para sua mãe, que via a filha apenas como uma forma de prender o marido que um dia, devido a uma gravidez inesperada da filha, deixou de ver a garota como a menina de seus olhos.

“Gertrudes, mimada pelo pai e pela mãe, cresceu com o peso desse nome que julgava velho. Um nome que não era dela. Um nome que não encontrava correspondente com o de outras meninas de sua rua, de sua escola, de sua geração. Um nome que lhe impôs a obrigação de não envelhecer, para assim com ele nunca combinar. Mas não somente o nome era determinante da imaturidade forçada. Ela tinha que continuar menina para não perder o importante papel que desempenhava nos jogos dos pais.”

O que eu gostei desse conto foi de como a autora lidou com o tema da maternidade, sem romantizar, apresentando um problema que é bastante comum. Eu gostei de como a questão da “família abusiva” foi apresentada de uma forma coerente e como a autora problematizou a situação e inseriu na trama a questão do carma e do ciclo vicioso.

Histórias do Meio do Mundo” é uma coletânea de contos que faz o leitor refletir sobre escolhas decidas, além de causar empatia pelas situações apresentadas ao longo da obra, evidenciando condições corriqueira que não ocorrem tão distante de nós. Um livro incrível, poético e lindo.


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8 respostas para “Histórias do Meio do Mundo – Julianne Veiga”.

  1. Avatar de Marielli Chinquio

    Que bacana! Tipo de livro que eu gosto! Vou ler!

    Curtido por 1 pessoa

    1. Avatar de Admirável Leitura

      Aaah que bom que gostou!

      Dê uma chance já que é seu tipo de leitura, certeza que não vai se arrepender!!

      Curtido por 1 pessoa

  2. Avatar de Julianne Veiga
    Julianne Veiga

    Muitíssimo obrigada por esta ótima resenha sobre o meu Histórias do meio do mundo, pela análise detalhada sobre o livro como um todo e pelos com destaques cuidadosamente feitos.
    Abraço,
    Julianne Veiga

    Curtido por 1 pessoa

    1. Avatar de Admirável Leitura

      Fico imensamente feliz que você tenha gostado Julianne!!

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  3. Avatar de Lembrar para não esquecer...

    Adorei conhecer um pouco de cada personagem apresentado. Assim que possível pretendo encomedar o livro…

    Curtido por 1 pessoa

    1. Avatar de Admirável Leitura

      Fico imensamente feliz com isso!
      Não se esqueça de encomendá-lo pelo link do blog, assim você ajuda bastante.

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  4. Avatar de blogdadivinablog

    Também gostei muito! Parabéns !

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    1. Avatar de Admirável Leitura

      Fico feliz que tenha gostado.

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