Embora tenha sido publicado em 2017, essa história me lembrou o nosso fim de ano em 2020, quando o isolamento social imposto pela pandemia do coronavírus nos obrigou a ficar em casa em uma quarentena que, naquele momento, parecia eterna.
Nome: Sete Dias Juntos
Autor: Francesca Hornak
Páginas: 436
Editora: Bertrand Brasil
Sinopse: A família Birch está ansiosa para o Natal. Bem, na verdade quase todos estão, isso porque esse é o primeiro fim de ano em anos que a filha mais velha de Emma e Andrew, Olívia, virá para as confraternizações. Entretanto, todos deveram ficar de quarentena por sete dias já que a moça estava fazendo trabalho médico voluntário na Libéria durante a crise do vírus Haag.
Mas será que eles vão conseguir passar tanto tempo juntos?
Ou melhor, que segredos escondidos a sete chave surgirão durante essa semana?
“Sete Dias Juntos” é aquele tipo de livro dramático que expõe em suas páginas uma trama de união e amor em meio a crises que qualquer família pode vir a ter. Desde rompimentos de noivados; filhos perdidos; casos extraconjugais; doenças graves; e crises de ansiedade pela incerteza do que ocorrerá no futuro.
Uma história natalina repleta de belas mensagens reflexivas e que está longe de ser boba e irrelevante.
Embora não seja uma narrativa pesada, ainda assim, o plot principal do romance e as subtramas que movem o enredo possuem uma carga melodramática, visto que todos naquele ambiente claustrofóbico possuem seus segredos e carregam culpas, medos, inseguranças, anseios e incertezas.
“Mas a memória é algo estranho. Você bloqueia os piores momentos, na maior parte do tempo… tão logo eles acontecem, muitas vezes, para poder superar. E então você se lembra deles, do nada, alguns anos depois.”
E pode até ser que ao longo da leitura pensemos “problema de gente rica”, afinal somos apresentados a um núcleo familiar abastado. Porém, ressalto que os problemas abordados na trama não são exclusivos de quem tem dinheiro, visto que qualquer pessoa pode desenvolver câncer ou ter um filho fora do casamento.
Ou seja, aqui temos situações corriqueiras que acontecem em seios familiares pobres e ricos.
No entanto, o que mais chama a atenção na narrativa é perceber como a personalidade de cada personagem é construída com base na bagagem cultural e moral de cada um. Todos são diferentes e é essa divergência de pensamentos que os fazem se afastar uns dos outros por uma coisa chamada; egoísmo.
Uma família desestruturada
Se teve um ponto que eu gostei em “Sete Dias Juntos” foi o desenvolvimento e amadurecimento pessoal de cada um dos protagonistas que compõem a obra. Aqui, todos são construídos com base nas suas próprias manias, medos, anseios e visões de mundo.
Olívia é a filha mais velha dos Birch formada em medicina e que estava fazendo voluntariado na Libéria para ajudar o país a lutar contra o vírus Haag, suas opiniões são fortes e ela sempre critica a maneira materialista com que sua família vive; Por outro lado, temos a caçula Phoebe, uma típica garota inglesa rica que só pensa em festas e no namorado com quem acabou de noivar, sua vida parece girar em volta de seu umbigo.
Ao longo do enredo acompanhamos como as irmãs não apenas interagem entre si, mas como, aos poucos a relação delas vai se costurando e moldando apesar das diferenças. Cada uma delas amadurece ao seu próprio modo e mostra que é bem mais do que suas próprias características de personalidade.
“Era por isso que ela detestava segredos. Quando eles se revelavam, como sempre acontecia, abriam um labirinto de coisas desconhecidas.”
Quanto aos progenitores das meninas, conhecemos o patriarca Andrew, o pai e marido que só não é ausente porque tem olhos apenas para a filha mais nova, não percebendo as coisas que ocorrem ao seu redor; Já a matriarca Emma se encontra presa nas paredes invisíveis de seu passado e infância de menina rica que vivia em uma mansão.
E além de todo esse grupo familiar distinto, conhecemos o jovem e alegre americano Jesse, filho desconhecido de Andrew que caí de paraquedas nos problemas dos Birch. Um rapaz sonhador que idolatra o pai que nunca conheceu e deseja apenas agradar, entretanto tem o pequeno problema de falar demais quando deve permanecer quieto.
A interação entre esses três últimos personagens é interessante de ler, enquanto Emma e Andrew estão descobrindo os segredos que cada um escondeu do outro ao longo dos anos de casados, agora também tem de lidar com o fato de Jesse ter aparecido na porta deles com o desejo de conhecer o pai biológico.
Para resumir, esse é um bom drama familiar digno do “Casos de Família”.
A quarentena
E tenho que admitir que é quase impossível fazer essa leitura e não se lembrar da época de agonia que passamos no final de 2020, quando a pandemia do coronavírus estava latente em todo o mundo e não era possível passar as festas de fim de ano com aqueles que amamos.
Devo salientar que o livro expressa bem como é se sentir preso dentro de uma casa, com pessoas que você não compreende e que também não parecem se esforçar para te entender. O principal conflito do enredo é aproximar uma família que parece composta por estranhos que, além de não saberem nada um sobre o outro, pouco se importam com o que cada um sente ou pensa.
“Mas uma zona de guerra, a crise humana, muda tudo. Faz com que nos comportemos de maneira diferente da habitual. Faz correr riscos, suponho.”
Enquanto lia eu pensei diversas vezes sobre como a obra retratou bem o que deve ter sido a quarentena de muitas famílias ao redor do mundo. Pessoas que tiveram que parar suas vidas para permanecerem em casa, trancadas umas com as outras, tendo que conviver com as diferenças de cada um.
Querendo ou não, um isolamento do tipo tem o poder de fazer as pessoas se conhecerem e se compreenderem. E assim como pode terminar relações, também pode salvá-las.
Uma história feliz?
Confesso que talvez a minha escolha de literatura natalina não tenha sido a das melhores, afinal aqui temos um enredo carregado de drama que surpreende por ter um desfecho inesperado que não é tão feliz assim. Entretanto, admito que essa foi uma leitura repleta de mensagens que me fizeram refletir sobre a importância de se estar em família e como ter pais e irmãos unidos é algo bom, que nos ajuda a superar os obstáculos impostos pela vida.
Essa não é uma história feliz como a maioria das obras que retratam a comemoração, mas é uma narrativa que fala sobre a realidade.
“Agora sei que a vida é curta demais para se preocupar com coisas pequenas. Pois preocupar- se com elas dia sim, dia não é a maior tragédia do nosso mimado mundo ocidental.”
Afinal, não é uma simples data que pode mudar o mundo ou as pessoas, não é mesmo? Apenas quem pode mudar as coisas, a percepção sobre algo ou alguém, somos nós mesmos. O Natal é sim, tempo de paz e união, mas dificilmente vai ser o alicerce para a cura do câncer; para salvar um casamento fadado a perdição; ou mesmo para fazer com que uma noite tórrida de amor nunca tenha acontecido.
Então fica a reflexão de que esse é um livro natalino sim, mas que não possuí aquela magia falsificada da festividade que muitas obras nos vendem.
“Sete Dias Juntos” pode não ser o livro perfeito para a época natalina por ser uma leitura dramática e que não evoca com força o sentimento “mágico” da festividade, entretanto é uma narrativa potente em transmitir a mensagem de que a união familiar é de extrema importância para que os obstáculos da vida possam ser superados.
Afinal, o Natal não é uma data mágica, são as pessoas que tornam esse dia mágico.