Aviso: Esta resenha pode conter Spoilers. Continue por sua conta e risco.
Alerta de Gatilhos: Luto.
Uma leitura sensível feita por meio de uma obra curta, mas grandiosa. Um grande exercício de empatia para com o próximo e um dos livros mais emocionantes que você pode vir a ler algum dia.
Nome: Passarinha
Autor: Kathryn Erskine
Páginas: 202
Editora: Valentina
Sinopse: Caitlin é uma menina de 10 anos, autista e que acabou de perder o irmão de forma trágica e violenta. Agora é só ela e seu pai, um homem viúvo que se encontra terrivelmente abalado com a morte do filho mais velho. Fazendo acompanhamento psicológico com a orientadora de sua escola, Caitlin tem que aprender a superar o luto, entender a morte de seu irmão e encontrar um desfecho para esse ponto trágico de sua vida.
“Passarinha” é aquele tipo de livro que com toda a certeza vai emocionar aquele que se aventurar em suas poucas mais de 200 páginas. Uma história com uma narrativa sensível que consegue provocar empatia e conectar o leitor com a protagonista e narradora da trama, Caitlin, uma menina autista que tem de superar a morte trágica de seu irmão mais velho.
Através da narrativa em primeira pessoa, o leitor tem a oportunidade de vislumbrar como se encontra a mente da personagem, podendo entender suas emoções e se colocar constantemente em seu lugar, compreendendo como é difícil para a menina assimilar as coisas e se acostumar com a sua nova realidade. Afinal, Devon era tudo para Caitlin, era seu irmão mais velho, seu amigo, seu mentor e seu refúgio.
“A gente não deve sorrir quando faz alguma coisa errada porque um sorriso é para mostrar que a gente está sendo legal.”
E, embora não esteja presente fisicamente na narrativa, Devon é um personagem cativante e de grande relevância na trama. A forma como Caitlin o descreve e o exalta é bela e evidencia a conexão que existia entre eles, fazendo com que o leitor sinta aquele aperto no peito de saber que a vida de um rapaz tão jovem foi interrompida de forma trágica e precoce.
E além dessa abordagem sensível, delicada e ao mesmo tempo crua do espectro autista, a trama também apresenta um ponto interessante de destacar; o pai de Caitlin, visto que é impossível não se compadecer com a dor e desespero desse pai, compreender seus medos e anseios. Um homem solitário, que tem que lidar com uma filha especial e não faz ideia de como fazer isso enquanto supera a perda de um filho.
Abordagem do Espectro Autista
Esse é o primeiro ponto que quero abordar com mais ênfase na resenha de “Passarinha”; o quanto a autora, Kathryn Erskine, foi cuidadosa ao inserir as nuances, medos e crises de uma personagem que está inserida dentro do espectro autista.
Aqui, o leitor acompanha uma menina de 11 anos que tem que lidar com o luto. Uma personagem que apesar de fragilizada, é muito mais a frente em seus pensamentos e questionamentos, possuindo uma mente ágil para lidar com certas situações, mas que não entende completamente a complexidade do mundo a sua volta.
“Todo mundo vai ter que aguentar ser especial porque todo mundo está vivo.”
Apesar de ser um livro em grande parte triste, visto que evoca com crueza a dura realidade da aceitação da perda, essa é uma trama que transmite ao leitor empatia, principalmente ao apresentar as dificuldades de Caitlin ao ter que lidar com a morte.
Uma obra que evidencia com delicadeza o que se passa na mente da personagem e o quanto a perda de um ente querido é mais confusa para ela. Afinal Caitlin não sabe como lidar com a dor, ela entende que seu irmão não vai voltar, mas a lembrança dele está constantemente em sua memória e a faz querer vivenciar os momentos felizes que teve ao seu lado.
Um outro ponto importante a ser ressaltado, é o fato de que através da perspectiva da personagem, o leitor se conecta com ela e com suas dores e passa a compreender um pouco do luto, entendendo como para algumas pessoas superar perdas é mais difícil do que para outras.
Ou seja, é uma obra que causa grande empatia.
Abordagem do luto
Uma coisa que gostei bastante em “Passarinha” foi como a autora abordou o luto de diversos personagens que compõem a narrativa e os fez superar a dor juntos.
Aqui, não temos apenas Caitlin passando pelo momento, mas também seu pai e um colega de escola da menina, Michael, que teve sua mãe assassinada no mesmo massacre escolar em que Devon foi morto. Cada personagem vive a sua própria dor e tem de lidar com a perda da sua própria maneira.
É bonito ver a amizade que surge entre Caitlin e Michael devido a perda dolorosa de seus entes queridos, ambos criam uma conexão instantânea, afinal estão passando pelo mesmo processo de cura. É assim que eles se apoiam um no outro para encontrar seus próprios desfechos e finalizar aquele ciclo, oferecendo uma despedida digna para aqueles que se foram.
“Eu gosto das coisas em preto e branco. Preto e branco é mais fácil de entender. Cor demais confunde a cabeça da gente.”
Outro ponto interessante é o fato de que além das pessoas que sofrem pelo luto, a autora insere um personagem que é primo de um dos autores do massacre, Josh.
Apesar de não aparecer tanto na trama, é interessante mencionar o quanto o personagem tem um bom “background”, afinal suas atitudes com outras crianças pode ser considerado um reflexo pelo tratamento que ele passa a receber, sendo visto por muitos como um monstro apenas por ser primo do atirador da escola em que Devon e a mãe de Michael foram mortos.
Essa trama em questão é de grande importância na narrativa pelo fato da autora transmitir a mensagem de que as pessoas são diferentes, por mais que sejam parentes próximos, ninguém é igual a ninguém.
O pai
Optei por fazer um tópico apenas para o pai de Caitlin porque acredito que de todos os personagens coadjuvantes inseridos na narrativa, ele seja o que tenha me causado mais empatia ao longo da leitura.
Isso porque é através do olhar infantil de Caitlin que conhecemos um homem devastado pelo luto, alguém que está perdido e não faz ideia de como continuar a caminhar. Um personagem que possuí tantas dores e cicatrizes que faz com que a gente se apegue a ele em todos os momentos que o vemos chorar.
Aqui, o luto do pai não se faz apenas pela morte de seu filho mais velho, Devon, mas também pela perda de sua esposa e foi esse fato em específico que fez com que eu me colocasse em seu lugar e entendesse a sua dor, compreendendo o turbilhão de pensamentos que povoavam sua mente.
“Quando você olha dentro dos olhos de alguém pode ver muito sobre a pessoa.”
Um pai viúvo, tendo que lidar com o luto pelo filho mais velho que o ajudava a cuidar da irmã mais nova, uma menina portadora do espectro autista. Pensar em como ele se supera ao longo da trama para tentar ser um pai melhor; como ele não consegue se manter forte frente a sua filha; como ele está destruído por dentro; pensar em todas essas colocações é doloroso.
Certamente, ele se tornou um dos meus pais preferidos da literatura. Afinal, diante de todas as circunstâncias ele dá o seu melhor, ele tenta viver dia após dia e, por fim, consegue, junto a sua filha, superar um pouco de sua dor.
“Passarinha” é um livro que eu recomendo a todos. Uma história sensível, delicada e emocionante. Uma obra de imenso valor narrativo que fala sobre superação, perdão, empatia e recomeços.
Excelente resenha! Bem detalhada, me ajudou a matar saudade dessa história
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