Já imaginou uma idosa de 86 anos viajar para a Antártica a fim de conhecer uma comunidade de Pinguins?! Esse é o plot desse livro. Mas, acredite que essa obra vai muito além de uma história divertida, sendo profunda e reflexiva ao abordar de forma delicada questões que envolvem a solidão, o perdão, o autoconhecimento e o amor.
Nome: Verônica e os Pinguins
Autor: Hazel Prior
Páginas: 352
Editora: Edição de Fevereiro da Tag Inéditos.
Sinopse: Verônica é uma senhora riquíssima que vive no conforto de uma mansão na Escócia. Solitária, a senhora tem apenas a companhia da moça da faxina, Eilleen. Um dia, após assistir a um documentário sobre pinguins-de-adélia na televisão, Verônica decide que após seu falecimento, deixará toda a sua fortuna para um centro de pesquisa que estuda esses animais. Porém, a descoberta de um neto, até então desconhecido, pode vir a mudar muitas coisas na sua vida tranquila e pacata.
“Verônica e os Pinguins” é aquele tipo de livro que ao mesmo tempo que diverte o leitor ao longo da trama, também emociona em alguns momentos. Uma história leve e divertida, mas que detêm a dose certa de drama para arrancar suspiros e até algumas lágrimas do leitor.
Resumindo, a leitura perfeita para quem quer ficar com o coração quentinho, quentinho.
Apesar de ser um livro divertido e bastante leve, a obra possuí sua dose de seriedade ao abordar questões profundas e reflexivas, o que dá um certo peso na narrativa.
Nesse livro, o leitor descobre uma história que fala sobre solidão, perdão, amor, guerra e principalmente, sobre autoconhecimento. A obra também evidencia a importância da preservação ambiental, expondo como o ser humano está aos poucos destruindo a sua própria moradia.
“À medida que a gente envelhece, é como se a capacidade para o amor crescesse.”
Ou seja, o livro detêm o equilíbrio perfeito entre diversão e reflexão.
Mas é claro, que a cereja do bolo fica a cargo da delícia que é ver os pinguins. Coisinhas mais fofas! É um deleite e tanto observar a interação de Verônica, uma senhora de 86 anos, com esses animaizinhos carismáticos e escandalosos. E é através da paixão pelos pinguins que a idosa se permite ter um pouco de “diversão” e “afeto” em sua vida.
Afinal, seu passado não foi dos melhores e ela tem inúmeros bons motivos para ser tão casca dura quanto é.
Uma protagonista de 86 anos
“Verônica e os Pinguins” foi o primeiro livro protagonizado por uma idosa que eu li, e certamente, não será o último. Eu aprendi tanto com essa senhorinha, tive tantas reflexões e tantos ensinamentos valiosos que ela se tornou uma das minhas personagens preferidas da vida.
“Aconteceram coisas, e reagi a elas com rapidez e impulsividade à minha maneira, certa ou errada. Depois, o tempo passou, estendendo-se à frente, ano após ano, década após década, silêncio após silêncio. Como as camadas de terra, rocha e gelo que se formaram sobre a superfície da Terra. Quem saberia ou se preocuparia com um fogo queimando nas profundezas, bem no seu âmago?”
Verônica não é uma pessoa fácil de se lidar. É rabugenta, resmungona, e de vez em quando, pode ser bastante grossa. Mas, é fácil julgar uma pessoa por suas atitudes sem conhecer o que de fato a faz ter esse tipo de comportamento, né? E quer saber? Verônica tem muitos motivos para querer afastar as pessoas de si. E são as suas razões que fazem com que a compreensão e a empatia pela personagem reine na narrativa.
Sua juventude não foi fácil, ela cresceu seus tempos de mocinha com os horrores da guerra batendo em sua porta. Teve perdas que não foram fáceis de ser aceitadas, foi rejeitada, humilhada e principalmente, teve seu bem mais precioso tirado de si a força.
E o mais emocionante de tudo, é ver como Verônica conseguiu superar suas dores, se tornando uma mulher forte e admirável, mas que infelizmente, se fechou para o mundo e para as pessoas, preferindo a solidão e a sua própria companhia.
A solidão que permeia a obra
Mas não é apenas a idosa de “Verônica e os Pinguins” que possuí a solidão como melhor amiga. Fato é, que esse é um livro que fala principalmente sobre ficar sozinho, sobre ser sozinho, sobre se acostumar com o vazio e a falta de companhia de pessoas que possam ouvir e entender seu sofrimento, suas dores, seus medos.
Patrick, Terry, Dietrich, Mike. São todos solitários em suas próprias vidas e da sua própria forma.
“Tem gente que acha que ficar só e um problema para pessoas como eu, mas devo confessar que acho extremamente agradável. Reconheço que, às vezes, uma companhia humana se faz necessária, mas quase sempre ela acaba sendo incômoda, sob um ou outro aspecto.”
Patrick, o neto de Verônica, acabou de levar um fora da namorada e tem que viver sozinho em uma quitinete, sobrevivendo com o auxílio-desemprego e um bico que faz nas segundas-feiras, tendo como única companhia dois pés de maconha. O rapaz não vê nenhum sentido em sua vida; até Verônica aparecer em sua porta.
Terry, Dietrich e Mike são os pesquisadores de Pinguins-de-Adélia que trabalham na Ilha Locket, na Antártica. Os três são solitários a sua maneira. Enquanto Terry é uma apaixonada por pinguins e prefere a companhia destes a dos seres humanos, Mike é um rapaz resmungão que não sabe lidar com as pessoas a sua volta e Dietrich é um pai de família que está longe de seus filhos pequenos.
Percebe como todos os personagens precisam de um apoio? De um alento? De um pouco de vida?
E sabe o ponto positivo dessa solidão? É que é justamente a personagem mais solitária da narrativa que proporciona para cada um deles um pouco mais de vida. Seja se tornando uma amiga para Terry, fazendo Mike demonstrar sua gentileza e até conquistando um espaço como irmã mais velha para Dietrich.
Verônica consegue preencher o vazio dentro de si, preenchendo o vazio que existe dentro dos outros.
Antártica, Pinguins e a Preservação Ambiental
E claro que os Pinguins também tem uma grande contribuição para que todos possam ser melhores, reconhecer suas fraquezas e se permitirem viver com um pouco mais de “diversão” dentro de seus peitos.
Afinal, quem não ama Pinguins, não é mesmo?!
“Foi uma alegria ver os pinguins, mas também um choque. Seus olhos brilhantes em contas, seus corpos roliços, suas nadadeiras e pés característicos. O cheiro deles, assumidamente repugnante, mas, ao mesmo tempo, gratificante. Sua cacofonia de gritos trombeteando, grasnando e urrando. O jeito como eles andam, às vezes, em fila indiana, ao longo de uma via de pinguins; a maneira como correm e escorregam na neve. A maneira como bamboleiam seus traseiros, sacodem as penas e se alisam. Uma atitude de vida total e peculiarmente gregária.”
Fato é que Patrick ou Pip, o pinguim órfão que Verônica decide adotar, é o elo que acaba unindo todos os personagens aquela senhora rabugenta. Pip é um docinho, e é toda a sua fofura que faz com que esse seleto grupo demonstre o melhor que há em dentro de cada um deles.
Os Pinguins são a verdadeira fonte de amor de toda a narrativa.
É por isso que com uma certa sutileza, a autora, Hazel Prior, evidencia a importância da preservação ambiental, expondo as fraquezas e belezas das comunidades dos Pinguins, trazendo a tona um alerta de que contribuir para a proteção desses animais é essencial. Afinal, cada vez mais o homem tem destruído um pouco de sua própria moradia.
E além disso, ressalto que toda a ambientação da trama é maravilhosamente gelada de ler, praticamente uma viagem sem sair de casa. Toda a descrição de montanhas geladas, nevascas e até de cocô rosado de pinguins são um deleite para o leitor que não só aprende sobre a comunidade desses animaizinhos carismáticos, como visualiza cada local descrito.
Como a guerra nos afeta de diferentes formas
E por último, mas não menos importante, acho de grande relevância falarmos um pouco sobre a guerra e o quanto ela deixa feridas e cicatrizes permanentes na alma de uma pessoa. Afinal, se não fosse por tudo que sofreu durante a Segunda Guerra Mundial, é certo que Verônica seria uma pessoa diferente, não teria tantos machucados em sua alma.
Uma Guerra é tenebrosa não apenas para quem está lutando, mas também para todos os envolvidos ao redor dela, principalmente civis inocentes que não tem a ver com a briga de gente que se acha poderosa. Imagine quantas pessoas perderam seus entes queridos para bombardeios, quantas pessoas tiveram que se separar de seus filhos.
É triste e infelizmente uma realidade que vem se repetindo…
“São homens assim que provocam guerras, em que milhares de indivíduos amantes da paz são sacrificados para uma chamada causa ‘nobre’. A história olha para trás e diz que este lado venceu e aquele perdeu, mas a realidade é que ninguém ganhou. E quanto aos milhares de homens, mulheres e crianças que são massacrados por conta dessa atitude? Ninguém se incomoda com eles? Cada um deles importa. Cada um e todos eles.”
Verônica é o exemplo claro de uma pessoa que sobreviveu a guerra, mas que ao mesmo tempo morreu com ela. Ninguém é o mesmo depois de algo assim, uma parte sua deixa de existir e caminha ao lado de seus entes queridos dolorosamente mortos. É por isso que eu senti empatia por Verônica, que eu a entendi, a compreendi e a encaro como uma das personagens mais fortes que eu tive a honra de conhecer em um livro.
Então deem uma chance para que ela possa conquistar vocês também. Conheçam Verônica e todo o seu amor por Pinguins.
“Verônica e os Pinguins” é um livro divertido, que discorre sobre reflexões acerca dos relacionamentos interpessoais e da preservação ambiental. Uma história que aquece o coração do leitor e emociona ao apresentar uma personagem forte, moldada pelas dificuldades de sua vida.