Drácula – Bram Stocker

Aviso: Essa resenha possuí Spoilers. Continue por sua conta e risco.

Filmes, séries, jogos de videogame e até animes. “Drácula” inspirou e ainda inspira muitas obras. Entretanto, é relevante mencionar que absolutamente nenhuma delas, faz jus a essência da obra original e o seu impacto dentro da comunidade de horror.


“Em homens egoístas, a precaução é uma arma tão segura para seus inimigos quanto para eles próprios.”


Nome: Drácula
Autor: Bram Stocker
Páginas: 444
Editora: Nova Fronteira


Sinopse: Quando Jonathan Harker chega ao castelo do Conde Drácula, tudo parece normal, exceto por algumas atitudes estranhas do Conde. É claro, que a normalidade desaparece, assim como mistérios começam a surgir e o pobre Jonathan se vê preso em um verdadeiro inferno. Em outra parte do mundo, a noiva de Harker, Mina Murray e sua amiga Lucy Westenra passam um tempo em um local afastado da cidade grande. Sofrendo de sonambulismo, Lucy acaba desenvolvendo uma estranha condição que a faz definhar durante a noite. Só resta então a seu noivo, Arthur, pedir a ajuda do Professor Van Helsing, um homem repleto de superstições que desconfia de algumas coisas…


Drácula” é aquele tipo de livro que não vai agradar a qualquer leitor, mesmo que este, seja um fã inato de clássicos da literatura. O motivo: ele é um livro narrado de forma epistolar, sabemos da história do Conde através da visão de outros personagens que descrevem seus dias em diários ou cartas endereçadas a outros personagens. Fato é, que Drácula se muito aparece, é em pouco mais de duas páginas.

“Em homens egoístas, a precaução é uma arma tão segura para seus inimigos quanto para eles próprios.”

Entretanto, afirmo que essa é a magia proposta pela obra.

Quando temos uma história narrada através de cartas e diários, temos aquele ar de verossimilhança em suas páginas, uma forma que confere legitimidade a palavra dos narradores, ainda mais quando a história é apresentada por mais de um personagem, algo que confere confiabilidade aos fatos.

Sendo assim, é fácil entender que o Conde não aparece, afinal, a maior parte da trama gira em torno da caçada empreendida pelos personagens em encontrar e matar o vampiro que além de ceifar a vida de pessoas queridas, ameaça roubar uma outra para viver eternamente ao lado dele.

A Caçada ao Drácula

E eu gostei da caçada e de como ela se desenrola.

Bram Stocker, conduz a sua narrativa em uma espécie de investigação, onde os personagens têm de descobrir aonde Drácula se encontra e quais passos ele vai dar. É interessante, ler como tudo se ajusta da melhor forma possível, principalmente devido ao autor inserir um rapaz de classe alta, que consegue subornar as pessoas para conseguir informações.

“Está acostumado a lidar com os loucos. Todos os homens são loucos, de um jeito ou de outro, já que você age discretamente com seus loucos, aja assim com os loucos de Deus.”

Ademais, o grupo formado pelo Professor Van Helsing, Jonathan, Quincy, Arthur, Dr. Seward e claro, Mina, é bastante funcional. Cada um detêm uma espécie de posição dentro do que a trama da caçada se propõe. Se um ou dois são responsáveis por investigar, outros dois são responsáveis por montar a estratégia, enquanto um detêm o dinheiro necessário para custear a empreitada e o outro funciona como a força e segurança da missão.

Sim, o grupo é bom e funcional e é devido a essa funcionalidade que a busca contra o ser se torna interessante de acompanhar. Afinal, mesmo sendo humanos, todos possuem um páreo contra Drácula, visto que sabem suas limitações e formas de enfraquecê-lo.

O Conde não aparece muito…

Talvez, essa seja a maior fragilidade de toda a obra e o que faz as pessoas não gostarem tanto assim desse livro; a falta de aparição do Conde.

Apesar de “Drácula” ser o nome do livro, o personagem aparece muito pouco, mesmo sendo o grande vilão e detentor de momentos sinistros que conseguem deixar o mais fraco dos leitores um tanto assustado, suas aparições e momentos são mais implícitos que explícitos.

“Lá dentro estava um homem alto e idoso, sem barba e com um bigode branco e comprido, vestido de preto da cabeça aos pés. Não havia nele um único detalhe colorido. Tinha nas mãos um antigo lampião de prata, em que a chama queimava sem manga ou globo de qualquer tipo e lançava sombras longas e trêmulas enquanto bruxuleava sob a corrente de ar que vinha através da porta aberta.”

Ao lado de uma cama durante a madrugada, na forma de um morcego ou mesmo quando Mina acaba ficando em transe devido a hipnose do Professor Van Helsing. Drácula não tem uma aparição muito visível, mas nem por isso é possível dizer que as vezes em que sua presença surge, elas não são memoráveis.

O Conde, pode não estar presente fisicamente durante a narrativa, mas ele está presente de uma forma muito mais amedrontadora e é justamente o fato de sua forma física não estar aparente, que torna esse, um livro absurdamente sombrio.

Superstição

Um dos pontos que mais gosto em narrativas de horror clássico, é ver como a sociedade da época se agarrava as superstições e formas de tentar conter os males que poderiam assombrá-los.

“Se é devido ao medo da velha senhora, ou às várias superstições deste lugar, ou ao próprio crucifixo, não sei, mas minha mente não está tranquila como de hábito.”

Em “Drácula”, temos um vislumbre bastante interessante de toda a superstição local, seja quando Jonathan chega na Transilvânia e informa em um hotel que será o hóspede do Conde Drácula e as pessoas além de se benzerem, também o fazem com Jonathan. Ou mesmo, quando Van Helsing enche quartos e o pescoço de seus amigos com cordões feito com alho a fim de espantar o ser noturno.

É interessante, ler como o desconhecido e o sombrio afetava a população, se tornando algo temido e que poderia ser afastado com algumas coisas simples como hóstia, crucifixo e alho.

Gosto disso, afinal mostra o quanto o ser humano é apegado a fé.

Romance Epistolar

Há quem goste e quem não goste é claro, como todo gênero que possui seus fãs e seus desafetos. Fato é, que eu acho que “Drácula” combina e muito com a narrativa epistolar a que se propõe.

Quando lemos toda a trama do Conde vampiro que passa a assolar alguns locais da Inglaterra pelo ponto de vista de vários personagens diferentes, acabamos por legitimar a obra, já que um narrador em primeira pessoa não é confiável, mas quando a história é contada por múltiplos narradores, existe um “que” de factual que torna a trama legitima e possível, afinal existem confirmações.

“Nunca vi um rosto com tamanha malícia e frustação; e nunca mais, creio eu, esse rosto há de ser contemplado por olhos mortais. A bonita cor tornou-se lívida, os olhos pareciam lançar centelhas do fogo do inferno, as sobrancelhas estavam franzidas como se as dobras da pele fosse as serpentes da Medusa, e os belos lábios manchados de sangue abriram-se num quadrado, como aquelas máscaras gregas ou japonesas. Se algum rosto jamais significou morte – se a a aparência matar -, então foi o que vimos naquele momento.”

Além disso, vale mencionar toda a carga que a obra detêm, afinal quando lemos sobre o Conde em forma de cartas e diários temos aquela vaga sensação de verdade, ainda mais quando a história se passa no século XIX. A narrativa portanto, é um prato cheio para que essa história funcione da melhor forma possível com o leitor e não consigo imaginar como deve ter sido no ano de seu lançamento.

Um alvoroço talvez?

Clima Sombrio

Mas claro, que para um romance epistolar funcionar da forma como deve e passar os sentimentos que deseja que o leitor sinta, o clima da trama tem de combinar com seu gênero. Algo que não é nem um pouco subestimado em “Drácula”.

Toda a atmosfera sombria e enevoada, faz esse um livro com cenas arrepiantes e que podem causar pesadelos em pessoas mais frágeis. Uma das cenas que mais me impactou inclusive, foi a do conde no quarto com Mina, bebendo seu sangue. Existe um “que” de horror naquela cena que faz tudo nela ser absurdamente medonho.

“Para aumentar as dificuldades e os perigos daquele momento, rolos de neblina vinham do mar – nuvens brancas deslizando fantasmagoricamente, tão frias e úmidas que não era preciso ter muita imaginação para achar que os espíritos daqueles que haviam perecido no mar tocavam seus irmãos ainda vivos com as mãos viscosas da morte, e muitos estremeciam enquanto as espirais de neblina varriam a cidade.”

Ademais, os relatos do navio naufragado que cita a névoa constante que permeia o mar, são cenas que deixam o leitor não apenas aflito, mas imerso no horror que a obra deseja passar, afinal quando as coisas estão ruins dentro de um navio, não há muita coisa que se possa fazer, não é mesmo?

Outro ponto que deve ser mencionado, é o fato de termos algumas passagens em um hospício, assim como um personagem que está louco desde o início. Acompanhar sua degradação devido as influências do Conde, é bizarro e até mesmo amedrontador. Afinal, a loucura humana é por si só, medonha.

Machismo

E infelizmente, apesar de ter gostado bastante de “Drácula”, esse é um livro que possuí seus defeitos que não me agradaram, como o fato de ser um livro permeado por machismo, o que me deixou desconfortável e irritada durante a leitura.

Sim, eu sei que essa é uma narrativa escrita no século XIX e devemos olhar seu contexto para entender como as coisas eram. Compreendo também que nesse século, sobretudo na Europa, as mulheres eram tratadas como seres inferiores.

“O sangue de um homem corajoso é a melhor coisa nesta terra quando uma mulher está em dificuldades.”

Porém, ainda assim eu me senti bastante incomoda cada vez que lia o Professor Van Helsing se dirigir a Mina como “uma mulher com cérebro de homem”, afinal, é nítido que o personagem a diminui apenas por ser mulher, assim como é nítido a sua admiração pelo fato de ela, como ele próprio diz “pensar feito homem”.

Ademais, existem vários pontos no diário da própria Mina que corroboram com a ideia de que o homem é o centro das coisas, já que a personagem quase sempre elogiava a bondade e força dos rapazes que faziam de tudo para protegê-la, sempre mencionado “o que ela faria sem eles”.

Volto a reforçar que eu compreendo o contexto e período em que a trama foi escrita, mas, de qualquer forma, me senti desconfortável. Afinal, se “Drácula” fosse escrito nos dias atuais, é certo que Mina seria a mais forte deles e faria de tudo para SE salvar e não SER salva.

O Final…

Outro ponto que me deixou um tanto decepcionada foi o final do livro.

Admito, que eu esperava um pouco mais do final, mesmo que a luta do Conde Drácula contra seus perseguidores fosse algo completamente fora do alcance. Tudo acaba rápido e com um sopro que eu fiquei esperando que o epílogo tivesse uma cena extra do Conde retornando ou algo assim.

E não tem… O final é o final e ponto.

“Guarde bem em sua memória: o riso que bate à sua porta e lhe pergunta “Posso entrar?” não é o verdadeiro riso. Não! Esse reina e chega quando e como quer. Não pede permissão a quem quer que seja e não escolhe um momento apropriado. Diz apenas “Aqui estou”.”

Claro que eu entendo que colocar Drácula, um ser imortal e milenar, para lutar contra humanos meramente mortais seria exagerado, mas acho, que poderia ter um epílogo que mostrasse que o ser das trevas não iria ser destruído tão cedo.

Drácula” é um clássico da literatura mundial que perpassa gerações, sendo adaptado inúmeras vezes a todas as mídias conhecidas. Fato é, que nenhuma faz jus a obra original. Um livro que deu origem ao mito dos vampiros como conhecemos hoje, uma história que por mais que não assuste certos leitores, ainda consegue impressionar devido a atmosfera sombria que a cerca.


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8 comentários em “Drácula – Bram Stocker

  1. Por besteira não li quando um amigo o fazia. Quando me contou que era um romance epistolar, tive preconceito achando que a história seria chata contada em forma de cartas, afinal, já tinha visto o filme com Gary Oldman e esperava algo no estilo.

    Interessante que o Drácula aparecer pouco no livro tem o mesmo efeito que o Tubarão foi usar anos depois.

    Curtido por 2 pessoas

    1. AAAh eu entendo, esse gênero acaba tendo bastante preconceito mesmo, mas eu acho que é um dos gêneros que mais acrescenta verossimilhança na narrativa, exatamente por ser epistolar.

      Sim, ele aparece bem pouco, mas suas cenas são memoráveis.

      Se um dia puder e quiser, de uma chance que é um ótimo clássico do horror.

      Curtido por 1 pessoa

  2. Drácula é, na verdade, um romance sobre como as novas tecnologias de comunicação superam o velho modo de escrita. Sem o jornal e sem a máquina de escrever, a gangue da luz não pegaria o conde. O romance ainda prefigura outro fato comum na editoração literária hoje: a publicação da epistolografia de um autor. Assim, discute também a queda das fronteiras entre público e privado (que o romance já vinha fazendo desde suas origens, quando relatava a vida mundana e privada de seus personagens como se fossem biografias).

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