Machacallis – Luiz Ivo

Livro cedido em parceria com o autor.


Aviso: Essa resenha possuí Spoilers. Continue por sua conta e risco.

Se você é aquele leitor que adora uma boa história de suspense, e procura um mistério ambientado em terras tupiniquins, repleto de referências regionais. Então “Machacalis” é o livro ideal para você. Garanto que não vai se arrepender de conhecer essa história.


“O cigarro que antes era meu companheiro, agora se tornou um vício para mim.”

Nome: Machacalis
Autor: Luiz Ivo
Páginas: 498
Editora: Appris


Sinopse: Em 1968, a cidade interiorana de Machacalis se vê palco de uma misteriosa morte. Por se tratar de um local governado por coronéis, o caso é fechado como acidente doméstico. Oito anos depois, o inspetor Geraldo, resolve investigar por conta própria aquela estranha morte, já que para ele o que ocorreu foi um assassinato motivado por vingança. Simultaneamente, assassinatos em série começam a ocorrer em cidades vizinhas, tendo duas coisas em comum: Os mortos são estupradores e eles possuem dois tiros na genitália.

O que realmente ocorreu em 68? Quem é o assassino dos crimes atuais?


“Machacalis” é aquele tipo de livro que prende o leitor por revelar muitas coisas no início, mas manter o bom e velho suspense por meio dos personagens. Ou seja, apesar de nós leitores termos uma vaga ideia do que está ocorrendo na cidade mineira, é importante salientar que os personagens não sabem. E o fato de que o leitor começa a torcer para que eles descubram, faz dessa uma ótima história de suspense nacional.

“Theo olha para o breu na direção do curral e da divisa das duas propriedades. A escuridão é total e o silêncio aterrador. Sente um frio na espinha e muito medo. As pernas fraquejam e as mãos ficam trêmulas.”

Devo admitir que Ivo possuí uma escrita um tanto prolixa, mas isso não é um defeito por aqui, já que todas as descrições feitas ao longo da narrativa são essenciais para causar o clima de tensão que permeia a obra. Afinal, qualquer coisa pode acontecer a qualquer momento. E, como os personagens possuem vidas cotidianas e simplórias, as descrições são essenciais para causar o clima certo na trama.

Narrada em terceira pessoa e sempre no presente, esse é mais um dos acertos do livro. Na obra, o tempo narrativo munido as descrições detalhadas corroboram para que o leitor se sinta presente na narrativa, como se fosse uma espécie de investigador que está colhendo as melhores pistas para entender o que aconteceu. Certamente, um tempo verbal e um recurso narrativo muito bem utilizado pelo autor.

Coronelismo

A história se passa no ano de 1968, década em que muitas cidades do interior possuíam o coronelismo aflorado. Principalmente as cidades pequenas, que eram governadas por coronéis que mandavam e desmandavam nesses locais. Esse poder que tinham, deixava a população com receio de discordar ou enfrentar qualquer coronel, fazendo com que eles se aproveitassem e impusessem suas regras e vontades nas pessoas, fazendeiros e até na própria policia.

Esse autoridade dos coronéis é bastante evidente na trama. E se torna ainda mais perceptível quando o Coronel Omero morre e seu caso é fechado como “morte doméstica“. E porque menciono que fica evidente? Porque na narrativa é notório, que havia a possibilidade da morte ter sido provocada por um assassinato, ocasionado por uma discussão ocorrida entre Omero e um coronel rival.

Vale ressaltar, que nos anos 60, esse tipo de crime motivado por disputas entre coronéis rivais era bem comum.

Sendo assim, temos uma polícia comprada pelo dinheiro e influência que os donos de fazendas possuíam naquela época. Um prestígio que lhes dava poder de mandar e desmandar em tudo e todos. Uma prática que prejudicava fazendeiros menores, amedrontava a população e comprovava que a ética e a moral desses homens não existia.

Ivo tem um grande acerto ao trazer para a trama esses pontos. Afinal, uma investigação mal feita devido a suborno e interferência de pessoas com nomes grandes não é e nunca foi novidade no Brasil. Quem dirá, nos anos 60. A década palco de grandes mudanças políticas e de um período conturbado e difícil da nossa história.

Regionalismo Mineiro


Acrescento que eu amo livros nacionais. O motivo, é devido ao modo com que nossos autores optam por escrever. Formas narrativas que corroboram exclusivamente, para que o leitor conheça e aprecie por meio de algumas páginas um estado que não conhece.

Em “Machacalis“, Ivo faz um trabalho exemplar ao trazer em diálogos e trejeitos típicos de seus personagens, uma Minas Gerais interiorana. Um regionalismo que é empregado durante toda a narrativa, e que além de conectar o leitor com a maioria dos personagens apresentados, também o faz se sentir parte da história.

“O frescor da manhã, a leve brisa com o cheiro da fazenda e o cântico dos canários-da-terra é um convite ao ócio.”

As falas carregadas e marcadas, os momentos passados em volta de fogueiras, as grandes fazendas de gado; são pontos que conseguem transportar o leitor ao interior de Minas. É na fala simplória, marcada pelo sotaque típico do estado do Sudeste que os personagens se tornam humanos.

Cada uma das pessoas criadas e desenvolvidas por Ivo, é única a sua própria maneira. Personagens humanos, que aparentam uma vivacidade tão natural e realística que faz o leitor imaginar que já conheceu alguém parecido. Sem dúvida esse regionalismo mineiro é um dos grandes acertos da obra.

Desenvolvimento dos personagens

E é claro que ao mencionar toda a complexidade e humanidade dos personagens criados por Ivo, não posso deixar de mencionar o quanto o autor desenvolve bem cada um deles. Desde os vilões ou mesmo os mocinhos que compõem a narrativa, são muito bem estruturados e coerentes em suas atitudes. É fácil se identificar com alguns, sentir suas dores e temores, assim como é fácil detestar e sentir asco e repulsa de outros.

“Os ventos aumentam, assim como o forte cheiro de umidade no ar. Pouco depois começa a chuviscar e aos poucos vai aumentando de intensidade. O ruído da chuva sobre as telhas e o vapor d’água que penetra pelas frestas do telhado faz Theo se enfiar totalmente embaixo da coberta e se encolher ainda mais. O garoto está apavorado. Reza repetidas vezes para seu Anjo da Guarda até dormir de cansaço, agarrado ao seu livreto da catequese.”

Com personagens complexos, que possuem seus próprios terrores internos, Ivo consegue torná-los em poucas páginas aquele tipo de pessoa que o leitor faz questão de torcer à favor ou contra. Não obstante a isso, devo salientar que todos os sentimentos que a narrativa provoca são simplesmente méritos do autor, que entrega personagens bem desenvolvidos, dotados de emoções construídos de forma primorosa.

E são esses sentimentos que regem a trama inteira. Em “Machacalis“, muitos dos personagens são acometidos por uma série de sensações originadas de traumas vividos quando crianças. Eventos traumáticos e abusivos, que faz com que eles cresçam com uma barreira interior que os impede de ter uma vida normal. Essas crianças por terem a vida conturbada, acabam crescendo e amadurecendo com graves danos mentais, que corrobora para que eles assumam uma série de atitudes extremas.

Traumas e transtornos

Esse é o ponto que não posso deixar de mencionar. Toda a construção e degradação mental dos protagonistas é excelente, além de autenticar a discussão mais pertinentes do enredo; as consequências angustiantes que assassinatos, violência e abuso sexual causam na infância.

A história gira em torno de um incidente que ocorre na cidade de Machacalis e que acaba deixando perturbações irreversíveis na vida de Théo e Samantha. Enquanto que o rapaz, testemunha um assassinato quando é uma criança, a moça é a vítima de um crime hediondo. Esses dois episódios simultâneos são os catalisadores que provocam impactos, medos e revolta em ambos os personagens. Pesares que os impede de terem uma vida normal.

“A história do inspetor continua ecoando em sua cabeça e tenta imaginar uma razão para ter ficado por tantos anos desconectado desse passado. Pensa nos pesadelos recorrentes, nas crises de pânico inexplicáveis e as inúmeras vezes que sentiu que precisava de ajuda psicológica, mas nunca ninguém falou que ele poderia ter presenciado algo aterrador e que isso podia ser a causa de todos os seus problemas.”

Aqui, Ivo trás um retrato fiel de como esses eventos traumáticos vividos na infância, mudam excessivamente a vida de pessoas. A mente é algo complexo e para se proteger, cria barreiras invisíveis que impede as pessoas de reviverem suas piores comoções. No entanto, é pertinente mencionar que essa mesma barreira pode ocasionar danos terríveis e drásticas consequências futuras.

E esse ponto pode ser identificado e visto tanto em Théo, quanto em Samantha. Por mais que eles pareçam normais e saudáveis, são pessoas quebradas por dentro, que sofreram danos terríveis no passado e que não conseguem levar uma vida normal, por mais que queiram.

Machacalis” é um ótimo livro de suspense nacional. Com uma trama envolve e instigante, a obra apresenta uma discussão pertinente acerca das consequências que eventos trágicos provocam em crianças. Além disso, ao abordar um tema tão sensível, a obra retrata como a violência e o abuso pode destruir a mente e a vida de uma ou várias pessoas.


Alerta de gatilhos: Violência sexual e pedofilia.

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